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segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Paulistanos cheios de estilo trocam carro por bicicleta

É segunda-feira. Dia de reuniões de trabalho para o paulistano Daniel Guth, de 27 anos. Antes de sair de casa, na Vila Madalena, por volta das 9h30, o assessor parlamentar checa se o traje está completo: terno, gravata e capacete. É assim, depois de trocar o carro pela bicicleta, há dois anos, que ele faz o agradável trajeto de 6,5 quilômetros até a zona sul, onde trabalha. Sem pressa, tenta seguir por ruas mais tranquilas, caminhos alternativos que encontrou para fugir das avenidas movimentadas.

Quando isso não é possível, lá está Daniel no meio do trânsito caótico da capital paulista. O terno fica acomodado na cestinha de sua bicicleta, um modelo dobrável. Impossível não notá-lo, ainda que ele não seja o único.

Thiago Benicchio, cicloativista e diretor da Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade), acredita que 500 mil paulistanos se desloquem pela cidade em cima de uma bicicleta. “Isso mostra como as pessoas estão entendendo que a bicicleta não é um transporte alternativo e, na verdade, mais uma alternativa de transporte”, diz ele.

Já um estudo realizado pelo Metrô da cidade no ano passado apontou que 96% do uso de bicicleta em São Paulo é para deslocamentos de casa ao trabalho ou compras, por exemplo.
Nos últimos tempos, não é só diversão – ou quilos a menos na balança – que leva os paulistanos a apostarem no transporte sobre duas rodas. Daniel Guth contabiliza os ganhos. “Chego com mais disposição ao trabalho. Não gasto mais com carro e estacionamento, não tenho estresse no trânsito e também controlo meu tempo de trajeto”, orgulha-se ele, que começou pedalando duas vezes por semana e hoje usa a bicicleta em 99% de suas locomoções.

Paulo Saldiva, médico especialista em poluição atmosférica da USP, explica que, quando percebem estes co-benefícios diretos, as pessoas sentem-se atraídas pela bicicleta. “Só falar de melhorias para o meio ambiente a longo prazo não adianta”, diz ele, cicloativista há mais de 30 anos. Saldiva alerta que a exposição direta do ciclista à poluição no trânsito é menor do que a do motorista. “Primeiro, porque o ciclista não fica parado no trânsito; segundo, por causa dos efeitos anti-inflamatórios que o exercício físico promove no corpo”, esclarece. “Ainda não há pesquisas comparando o impacto de usar a bicicleta na atmosfera. Não há população ciclista suficiente. Mas uma coisa é certa: poluição zero.”

Bike para poucos
Segundo Thiago Benicchio, já começam a surgir muitas iniciativas públicas a favor dos ciclistas, mas falta que elas sejam integradas para não acontecer de uma ciclovia sair de um ponto, mas não levar a lugar nenhum. “No caso de Moema, na zona sul, por exemplo, a ciclovia precisa ser integrada a outras regiões. Mas já um passo”, avalia ele, referindo-se à ciclovia inaugurada no mês passado pela Prefeitura e que causou polêmica com a reação negativa de alguns moradores. “Nem todo mundo vê a bicicleta como um meio de transporte.”

Os cicloativistas ponderam ainda que não é necessário abandonar o carro e usar apenas bicicleta. “A ideia é usar a bicicleta em um momento oportuno, bem como o carro”, aconselha Benicchio. O músico e VJ da MTV Luiz Thunderbird, de 50 anos, é um cicloativista que ainda usa o carro. “Utilizo a bicicleta na maioria das vezes, seja para ir a reuniões de trabalho ou ao dentista. Já o carro é para momentos necessários, como quando vou ensaiar e preciso levar equipamentos”, conta ele, que pedala há 4 anos e possui duas bicicletas.

Thunderbird também é adepto das ‘bicicletadas’, realizadas sempre na última sexta-feira do mês, às 18h. O ponto de partida é a Praça do Ciclista, na Avenida Paulista. O movimento reúne, em média, 500 ciclistas, que percorrem em grupo as ruas da cidade. O grupo é um fenômeno mundial e, em vários países, o movimento se repete no mesmo dia. A ideia é disseminar o uso da bicicleta e discutir o espaço da cidade.

Nem lycra, nem tênis. Salto!
Os ciclistas urbanos usam a bike para ir ao trabalho, ao happy hour, à balada. Para tanto, devem estar bem alinhados. É de salto alto, vestido e cabelos ao vento – ou, algumas vezes, presos para acomodá-los dentro do capacete – que a paulistana Priscila Moreno, de 28 anos, pedala. “Não precisamos abrir mão do nosso estilo para pedalar.

Se é para usar a bicicleta, que seja como se fosse andar de metrô”, explica ela, seguidora do conceito ‘cycle chic’, termo cunhado pelo fotógrafo dinamarquês Mikael Colville-Andersen, cuja proposta é incentivar a adesão à bicicleta e usá-la com o próprio estilo, sem precisar recorrer a roupas de ginástica.

Com estilo mais básico, à base de sapatilhas, shortinhos e meias finas, a editora de vídeo Olivia Brenga, de 32 anos, é outra adepta do conceito disseminado na capital dinamarquesa Copenhagen. “A ideia é ser você mesmo e não ter de se adaptar à bike”, diz ela. Mas pedalar à paulistânia exige dicas e estratégias para se seguir o ‘cycle chic’ sem desconforto. “Algumas pessoas levam toalhinhas na bolsa. Eu evito saltos finos e altos, e a saia-lápis, pois aperta demais”, aconselha Priscila Moreno, que, de tanto precisar carregar objetos durante suas pedaladas, uniu o útil ao agradável. Ela criou um alforje de pano (uma espécie de bagageiro), que fica acoplado à estrutura da bicicleta. E a necessidade de estar segura e fashion virou negócio. “Vários amigos viram o meu e compraram. Os pedidos foram tantos que larguei o meu emprego em uma agência de relações públicas para fazer os alforjes, que são personalizados. Criei minha própria marca, a Sim: bicicletas, bolsas e afins.”

Um anjo de bicicleta
A atriz Luanna Jimenez, de 31 anos, que pode ser vista como a cabeleireira Tifany na série Macho Man, da Globo, era ciclista quando morava em Barão Geraldo, distrito a 12 quilômetros de Campinas (SP), enquanto concluía o curso de Artes Cênicas. Foram quatro anos locomovendo-se apenas de bicicleta. Em 2004, de volta a São Paulo, levou um choque ao se deparar com o trânsito desordenado da cidade grande. A bicicleta foi para a casa dos pais dela, no interior e, em seguida, vendida. A vontade de voltar a pedalar, no entanto, jamais passou. Um dia, a atriz pegou a bicicleta de um amigo e resolveu tentar. “Fui despreparada, tive uma péssima impressão. Desisti”, relata a atriz, que usa o carro, mas, às vezes, acaba recorrendo ao transporte público.

A convite da reportagem, Luanna testou o serviço gratuito do Bike Anjo, que nasceu despretensiosamente entre amigos cicloativistas que recebiam pedidos de ajuda de iniciantes. Hoje, o serviço possui voluntários em 28 cidades do Brasil (leia sobre a experiência de Luanna ao lado). “Um voluntário acompanha o ciclista iniciante em suas primeiras pedaladas, dá assistência quanto às melhores rotas e ensina medidas de segurança no trânsito”, explica a voluntária Evelyn Araripe, de 26 anos. “O serviço existe há mais de 3 anos, mas quando criamos o site para facilitar os pedidos, há 1 ano, o volume de solicitações ficou imenso. Até hoje, o Bike Anjo já ajudou mais de 350 paulistanos, de diferentes perfis, que têm vontade de aderir à bicicleta.” Um alento para quem quer começar a adotar um novo estilo de vida.

Jornal da Tarde
MARCELA RODRIGUES SILVA

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